Tenho sido cobrado por alguns amigos de copo por não tecer comentários nem emitir opiniões sobre as eleições que estão por vir. A estes incautos habitualmente sou obrigado a esclarecer que: a) política é um dos assuntos menos afins à audiência de retardados deste blog; e b) no momento está tudo praticamente sob controle. Explico.
Desde pequeno sempre fui fascinado com o processo eleitoral. Sabia o nome, número e partido de todos os candidatos, até alguns estaduais, e programava o vídeo-cassete pra gravar o horário eleitoral gratuito quando eu não estivesse em casa.
Pobre estudante bolsista de uma família de proletários de classe média baixa (quase um filho de quitandeiro), acreditava que votando em qualquer partido vermelho estaria fazendo a minha parte depois de tantas aulas de História e Geografia. Ledo engano.
Vivi o antagonismo Lula x Collor no seio da minha família, em suas ramificações repleta de coligações e conexões políticas ocultas, e desde cedo comecei a compreender o conceito de interesse político, principalmente concebendo a inafastabilidade do elemento subjetivo na composição de cada posicionamento político manifestado nos confins do universo.
Até mesmo aquele ser altruísta mais convicto de que certas idéias poderiam transformar toda uma sociedade e promover o bem comum, a despeito dos seus interesses individuais, não sabe que a construção de sua moral nada mais é do que reflexo de sua personalidade, e nela embutidos os seus interesses e vontades pessoais.
Poucas coisas são mais claras do que o estreito relacionamento de todos os políticos com os grupos sociais que de fato representam. “Comissão de Sucesso” de 5 milhões é só a pontinha do iceberg que ultrapassou a superfície por força do embate das urnas.
Não gostaria de precisar ser tão didático, mas como prevejo uma enxurrada de críticas oriundas da minha péssima forma de me expressar através de parábolas, sejamos mais francos: nenhum dos candidatos a qualquer coisa está minimamente interessado em promover justiça social, liberdade, igualdade fraternidade, legalização das drogas ou a paz mundial. É tudo mentira, manolo!
E, supunhetemos hipoteticamente, ainda que houvesse a tal vontade política, nenhum ocupante de mandato público é capaz por si só de subverter o status quo, salvo rara possibilidade se vier a contar com expressivo apoio popular – ou militar.
Cada um dos nossos pseudo-representantes, tal qual uma marionete, segue um programa de interesse exclusivo de seus entes vinculados e nos resta tentar identificar aquele que seria menos danoso à sociedade – no caso, mais afins aos nossos próprios interesses.
Com a dinâmica de alternância do poder instaurada após o fim do regime militar, o que temos visto é a determinância da propaganda política no resultado das urnas, como uma evolução natural do coronelismo que nos é característico – isso quando este não se manifesta mesmo de forma não-evoluída pelos bolsões de miséria intelectual do país.
Agora, com a perspectiva de vitória da situação em quase todo o território nacional ainda no primeiro turno, e considerando que a alternativa da “oposição” se apresenta ainda mais ameaçadora na maioria dos casos, acredito que não haja absolutamente nada com o que nos preocuparmos. Já estamos na merda mesmo e é assim que vai ficar depois de outubro.
Não me preocupo nem mesmo com os candidatos-celebridades que vão carregar correligionários corruptos na aba de suas votações por força do quociente eleitoral, nem com o sem-número de candidatos evangélicos que vão levar sua cultura deprimente de envolvimento estado/religião para o exercício do poder. Nada disto me parece tão chocante quanto a fragilidade e ineficácia do ordenamento jurídico pátrio em si, principalmente no que tange ao aspecto falsamente democrático de sua própria reformulação.
O processo eleitoral brasileiro pode até ser uma dádiva se formos pensar em tudo isto que esteve aí, mas o que acontece de quatro em quatro anos fatalmente tem cada vez menos a ver com a verdadeira festa da democracia, esta que nós construímos com nossas atitudes cívicas cotidianas.
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Este publieditorial foi financiado por um democrata cristão.