Quando me perguntam qual é o meu filme favorito, costumo responder “Beleza Americana”. Nunca fui muito chegado a dramas – adepto daquela máxima: “de triste, basta a realidade” – mas a história do suburbano que rompeu com os padrões americanos pra dar uma guinada na trama da própria vida, além de muito bonita, serviu como uma luva no exato momento em que eu vivia um momento de grandes transformações, aos 16 anos. E ainda tinha o Kevin Spacey. Fumando um.
Sempre tive certa inveja de quem tem “Star Wars” como filme (ou “triologia”, ou “franquia”, foda-se) favorito. Deve ser reconfortante ter como obra superlativa um fenômeno cultural insofismável, divisor de águas. Assisti à triologia original quando ainda era muito pequeno. Nem a história, nem os efeitos, nem a empolgação do meu pai, nada me pegou. Pra piorar ainda dei uma segunda chance à Força indo na pré-estreia do “Episódio 1”, mas a “Ameaça Fantasma” ficou só na ameaça mesmo. Depois de ver pessoas caracterizadas de Jedi na fila do cinema e duelos de sabre-de-luz antes de começar a sessão, minha expectativa subiu às alturas – pra depois tomar um tombo daqueles.
Fazendo as contas direito, acho que “The Matrix” é o meu “Star Wars”. Um filme empolgante, profundo e relevante ao mesmo tempo para a história do cinema e para a minha história pessoal. Eu tinha 15 anos e ainda estava descobrindo toda a podridão do universo nas aulas de História e Geografia quando tomei aquela surra de realidade, vinda de uma obra de ficção.
Foi a primeira (e única) vez na vida em que, ao terminar de assistir a um filme, levantei de um pulo, rebobinei a fita VHS (!) e assisti de novo.
Na época eu me informava sobre cinema através de uma revista (de papel, pasmem) que minha mãe assinava e, apesar de venderem o filme como “inexplicável”, a expectativa estava lá em cima – viu, George Lucas, o problema não era a expectativa, era o filme mesmo…
Que diabos seria essa tal Matrix?
Contudo, a pergunta que parecia irrespondível ficou bem clara após os 136 minutos de filme – e teria sido ainda mais clara se não fossem as continuações, que considero duas grandes blasfêmias desnecessárias.
A mistura de evangelho e cultura pop explodiu minha cabeça de estudante secundarista e todo o universo passou enfim a fazer sentido com aquela metáfora de proporções épicas: a vida não passa de uma grande manipulação, a qual só é possível abstrair com muita coragem e grande sofrimento.
Mesmo sem compreender a maioria das referências que o filme fazia (Jesus Cristo, Superman, Jet Li, Alice No País Das Maravilhas e outros) passei a entender perfeitamente todas as referências ao filme que viriam depois. Déjà vu? É só uma falha na Matrix.
Por fazer tanto sentido, passei um tempo estarrecido com o fato de que a grande maioria das pessoas, especialmente as mulheres e os mais velhos, ignoravam o filme displicentemente. Diziam não ver graça, ou simplesmente não terem entendido. E eu só queria meter-lhes uma pílula vermelha goela abaixo.
Hoje, mais velho, percebo que a mensagem tem que fazer parte do universo do interlocutor para ser compreendida. E o meu universo de linguagem era aquilo lá: computadores, porradaria e tiroteio. Nenhum trecho da Bíblia ou parábola com bichinhos jamais tocou meu coração quanto aquelas cenas de kung fu em bullet time.
BONUS TRACK – Já que estamos aqui, segue abaixo uma pequena lista de homenagens a Matrix encontradas no YouTube:
“The Matrix” resumido em 60 segundos
Triologia Matrix resumida em 2 minutos e meio
Se Matrix fosse um jogo de 8 Bit
Cena de Matrix recriada com Lego
24 razões por que The Matrix e The Lego Movie são o mesmo filme
As influências e referências de Matrix
Trailer honesto de “The Matrix”